Hoje sinto-me... Amarela!

Lembrar-me de ti está no espaço vazio que todos os dias deteto ao fazer a cama, sempre tão perfeita do teu lado…
Está nos petiscos que ambos partilhávamos com prazer, e que agora partilho com outras pessoas. E sei que poderás igualmente partilhar momentos com outras pessoas, mas o sabor nunca mais será o mesmo. Eu fazia-o com amor e dedicação, lembras-te? E continuo a fazê-lo, tu é que jamais o provarás de novo…
Às vezes penso que me fazes falta nas pequenas coisas domésticas, como pôr a louça na máquina, fazer café para dois… Ler o jornal numa esplanada cheia de sol, passear com as crianças à chuva, sentindo o odor da terra molhada…
Mas sei que não sinto a tua falta quando me insultavas por não poderes insultar-te a ti mesmo. Quando gritavas que me ias matar, que me odiavas e crescias para mim, fazendo-me encolher e temer pela minha vida… Quando a tua mão se ergueu para mim, eu senti que o meu mundo perfeito, tal como o conhecera até ali, tinha desmoronado… Nada mais seria como antes! Eu tinha perdido a inocência!
Como se não bastasse a violência psicológica, aquela que me reduzia a uma dimensão inimaginável, indigna e humilhante, soltaste ainda o monstro oculto que havia dentro de ti… E deixaste-me vê-lo, permitiste que o sentisse e, pior ainda, fizeste-o diante dos teus próprios filhos! E eu a desculpar-te, afinal era a crise, a famosa “crise dos quarenta”… Comprimidos e álcool não combinam muito bem; ou seja, até combinam, fazem uma mistura perversa e libertam o que de pior há dentro de nós… Eu conheci o teu animal enjaulado, uma criatura feia e cruel que vive dentro de ti!
Não, não sinto a tua falta quando me dizias que ias tomar café e só voltavas de madrugada, tendo a ousadia de te deitares ao meu lado… Como conseguias dormir? E eu tinha de me levantar, não suportava a tua presença, sentia-me nauseada, com um imenso mal-estar… Deixei de dormir, deixei de comer, sentia-me… Estranho, apesar de tudo, sentia-me culpada… Será este o complexo da vítima?
Hoje sei que só sou culpada por te ter amado como nunca ninguém te amou, e certamente nunca amará.
Eu não sou como me vias nos teus delírios patológicos; sou uma mulher linda por dentro e com muito amor para dar. Mas tu nunca vais saber disso, não é?… E também já não importa! Sou livre!

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