Hoje sinto-me... Papaia!

Estavas à janela, de costas para mim… Distraidamente observavas algo interessante que decorria na rua, alguma ação no género de um cão a correr desenfreadamente atrás de um esquilo, ou algo semelhante…
Não deste por mim… E eu fiquei ali, a olhar para ti, espiando-te na penumbra, silenciosamente… Gostava de olhar para ti sem que desses por isso, o que acontecia muito raramente porque, numa espécie de pressentimento, logo te voltavas para me dares as boas vindas…
Mas eu gostava de entrar pela calada, em bicos de pés, em estilo de gato, e ali ficava mirando-te, absorta nos meus pensamentos, tu nos teus, os dois presentes, mas ao mesmo tempo ausentes em espírito, porque esse vogava livremente algures pela estratosfera… Sempre por pouco tempo, claro, porque te voltavas e me sorrias, como quem sabe exatamente o que se passa no seu espaço vital, e qualquer intrusão é facilmente detetada.
E o teu sorriso, tão lindo, tão meigo, tão paciente, o sorriso de quem tem todo o tempo do mundo para me escutar, para me olhar e me entender, sem ser preciso dizer uma palavra… E quando me abraçavas, eu sabia que não eram necessárias palavras, não era mesmo preciso mais nada… Tudo o que sentíamos ficava depositado naquele abraço, e assim sabíamos tudo o que precisávamos de saber um do outro, numa comunicação sem ruído ou interrupções.
E naquele dia julguei que seria assim, um dia como os outros. Apesar de não te teres virado para mim, apesar de não me teres pressentido, como de tantas outras vezes… E eu ali, olhando-te, admirando-te, sorrindo para mim mesma por te amar tanto como te amava…
Avancei lentamente na tua direção, e abracei-te por trás… Os meus braços foram cruzar-se sobre o teu peito, a minha cabeça encostou-se suavemente ao teu ombro esquerdo, enquanto aspirava o teu aroma que sempre me deixava meio atordoada…
- Amo-te – murmurei baixinho, tão baixinho que receei que não tivesses escutado…
E tu viraste-te quase bruscamente, como que assustado com a ideia, e olhaste-me de frente, segurando-me firmemente os pulsos… Parecias subitamente tenso, e eu ali, exposta e amedrontada, pensando que tinha estragado tudo… Tanto trabalho de construção da relação, tanto investimento emocional disfarçado, e agora isto…
Lembrei-me da canção “Something stupid (like I love you)” e preparei-me para o embate… E tu ali, devassando-me com o teu olhar penetrante, e eu a sentir-me pequenina, idiota, frágil e indefesa… Ó céus, que estúpida!!! Mas porque raio fui dizer aquilo????
Com um puxão tentei libertar-me das tuas garras… Só queria fugir e esconder-me, sentia-me a arder de rubor e raiva de mim mesma… E então tu sorriste! Ou melhor, abriste um rasgado e zombeteiro sorriso, e eu quase explodi de vergonha…
- Anda cá, pequenina! – disseste-me, trocista, enquanto me abraçavas, ou, melhor dizendo, me embrulhavas nos teus braços fortes… - Sabes há quanto tempo eu queria ouvir-te dizer isso? Amo-te, amo-te, mas julguei que tu soubesses...

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